quinta-feira, 21 de julho de 2016

UM ASSENTO PARA DOIS



Autor: Carlos Delano Rebouças

Andar de ônibus urbano nas grandes cidades é muitas vezes tarefa difícil, imaginem, para que tem grandes dificuldades de locomoção?

Eugênio certamente defende essa tese. Homem de meia idade e com sobrepeso, todos os dias enfrenta uma verdadeira maratona com destino ao seu trabalho do outro lado da cidade, bem distante de sua casa na periferia de Fortaleza.

Certa vez, como faz diariamente e de segunda a segunda, pegou seu ônibus por volta das seis da manhã. Até que não tem tantas dificuldades, pois a parada é em frente a sua casa. Quando adentrou o coletivo, de cara enfrentou dificuldade de dar os primeiro passos nos degraus ocupados pelos passageiros. Sentiu-se uma sardinha dentro de uma lata. Até que chegasse ao outro obstáculo, que seria a catraca, foi outra batalha grande. Imagine-se um gordo de 137 quilos passando no corredor de um ônibus lotado, aliás, superlotado. Tarefa difícil, não é? Mas ele consegue, já que esta é sua única alternativa de transporte.

Com toda a dificuldade para caminhar dentro do coletivo, encontra um assento disponível para obesos. Porém, ocupado por uma jovem estudante, que não hesita em cedê-lo. Agradecido e já acomodado, Eugênio diz: “obrigado por me ceder este lugar, muitas vezes vou em pé, por ninguém ter a atitude cidadã que teve”.Ainda como forma de agradecimento e cordialidade, pede para segurar a mochila da garota e de alguns outros em sua volta.

Não demorou muito para Eugênio perceber que a pessoa que estava ao seu lado parecia se incomodar com a sua presença. Sentia-se sufocado por aquele corpanzil, que a cada curva o lançava às dezenas de corpos em pé de um corredor lotado. Sem eles, estaria certamente jogado ao assoalho do ônibus.

Sem demora e ainda demonstrando educação, embora muito irritado, fala o homem: “Moço, o assento é para dois passageiros e o senhor está querendo ocupar o meu espaço”. Eugênio, prevendo sua atitude, já que não se trataria de uma novidade ao longo de sua longa jornada de passageiro de transporte coletivo, já enfrentar situações semelhantes, disse: Senhor, mil desculpas, estou fazendo o máximo para não lhe incomodar, mas o simples fato de ser gordo já é um incômodo, não somente para o senhor, que vê a cada curva feita o seu espaço perdido, nem para os demais passageiros que dividem diariamente esse espaço comigo e que muitos também devem se sentir importunados, mas muito mais para mim, que tenho que ver olhares discriminatórios e preconceituosos, e ouvir palavras que machucam bem mais. Ainda bem que as suas foram diferentes e machucaram bem menos.

Enquanto respondia ao vizinho de assento, diversos passageiros também se apresentavam como receptores de uma mensagem que lhes tocou o coração. Sem muitas palavras, teve o apoio de sua grande maioria. Sem muitos adjetivos, teve sua predicação. Mas foi somente isso que confortou o Senhor Eugênio naquele momento de aflição?

Não. Aquele senhor que reclamara olhou em seus olhos e de forma arrependida disse: Fique tranquilo, senhor, aceite as minhas sinceras desculpas. Minha intenção estava distante de desrespeitá-lo.

Imediatamente o homem se levantou, cedeu o seu lugar ao Senhor Eugênio para que ocupasse os dois assentos, diante de aplausos e gritos de “é isso aí, parabéns”.

Assim nasceu uma grande amizade entre Eugênio e Lousada, aquele senhor que soube lidar com as dificuldades de alguém, como muitos que estão ao nosso lado.

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