terça-feira, 26 de julho de 2016

ESCÓRIAS DA SOCIEDADE?


Por Carlos Delano Rebouças

A rua é de todos! Assim é o grito de quem a escolhe para viver e se intitula seu legítimo morador. Nela, poucos são vistos como mocinhos; muitos, antagonistas de uma história de horror.

Um dia parei para observar como vivem. Juro que busquei entender escolhas e caminhos seguidos por muitos que até um dia desses tinham casa e família estabelecida. Confesso que tentei encontrar respostas para tanto sofrimento e tantas privações, quando se contentam com tão pouco.

A felicidade se estampa no rosto numa singela sopa recebida. Um cobertor ou touca usada, ou uma simples meia que não serve para alguém, significa muito para quem tem tão pouco e cara de ninguém. O frio castiga e mata. Quantos morrem sem saber. Dormem num inevitável sono de uma noite indesejada, e desprotegidos, não veem o sol raiar de um novo dia que se poderia se anunciar. O frio rouba vidas, assim como os próprios moradores de rua esperam o sono chegar daqueles vizinhos que deve dormir sempre com um dos olhos abertos, pela defesa do pouco que tem.

E o que seria deles se não fossem as almas generosas, pessoas que voluntariamente saem na madrugada alimentando, agasalhando e estendendo sua mãe e abrindo seus corações, para minimizar o sofrimento de tantos vistos com escórias de uma sociedade que recrimina?

Ainda bem que no mundo existem espécies raras de pessoas que têm sensibilidade; que sabem que conviver com o frio da noite não é nada fácil. Se no Nordeste brasileiro é difícil, imagine que passa noites nas ruas do Sul e do Sudeste brasileiro, sem ter muito com que se agasalhar ou sem uma sopa quente para aquecer. Parabéns a estas pessoas que demonstram humanidade com aqueles que a sociedade, na sua maioria, enxergar como um peso na economia e que em nada contribui e influi.

Escórias que nada! Pessoas que precisam de ajuda, de uma atenção. São muitas histórias diferentes, que chocam, emocionam e motivam. São muitos personagens que merecem atenção e um destaque maior, pois são grandes artistas da vida real, como aquele do filme O Solista, que narra a história real de um morador de rua esquizofrênico, de admiráveis habilidades com o violino, descoberto por um jornalista que desejava abordar a sua história de vida nas ruas.

Como Nathaniel Ayers, protagonista do filme, as ruas do Brasil têm muitos, nem tanto com o mesmo dom musical, mas quem sabe, outros que possam sensibilizar tanto quanto. Quem sabe um dia, possamos encontrar um personagem desses e nos permitir que nos sejam ouvidos, antes que o frio e a insegurança da noite ceifem suas vidas.

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