segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

Hipocondria Tecnológica


 Carlos Delano Rebouças


Quem de nós nunca, em algum momento da vida, não se automedicou? Que atire a primeira pedra aquele que não conta ou já não contou com pelo menos uma cartelinha de analgésico em sua casa? 


Para as dores da vida, esse é o recurso. Buscamos nos remediar de alguma forma para minimizar o sofrimento em relação a alguma coisa, e com as feridas da alma não seria diferente. Sempre pode haver uma forma de remediar, não é? E parafraseando o dito popular, "De médico e louco, quem de nós não somos um pouco?"


Mas não é apenas o corpo que adoece, tampouco vai ser somente ele que estará na pole position dessa corrida que pode levar à autoflagelação, à autodestruição. A mente também é um dos principais alvos de adoecimento, e, não diferentemente do corpo, reflete direta e inevitavelmente um no outro. No entanto, chego a acreditar que estamos bem mais com o corpo em dia que que a mente. Não acham?


Assim, para suavizar esses impactos, sobretudo na mente, buscamos ocupá-la de alguma forma. O que antes era feito pela leitura de um livro, pelo exercício de uma atividade profissional, pela realização de esporte ou qualquer ocupação que preenchesse o tempo e nos deixasse menos possível a disposição do tédio, hoje, aliás, de um tempo para cá, passamos a acreditar que a única forma de preencher essa lacuna é com a tecnologia e seus atrativos.


Nunca temos dinheiro para comprar livros, para realizar um passeio em família, para uma pizza no fim de semana, muito menos para custear um plano de saúde. Contudo, temos sim para uma TV por assinatura, para uma Internet de qualidade, para a aquisição de equipamentos tecnológicos, para assinatura de canais de entretenimento...Ah! Temos para tudo isso, sim, pois é tudo isso mesmo que me acalma, que me diverte, que me consola...


Mas não podemos, nem devemos reconhecer que também nos adoecem. Se acreditarmos que se tratam de um bálsamo, como algo que está nos fazendo um enorme bem, saibam que também possuem seus efeitos colaterais como qualquer medicação. Talvez curem por um lado, e nos destroem por outro. 

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

Networking

Certa vez eu li que, quando somos jovens, estamos mais abertos a novas amizades. A principal explicação para isso é o fato de vivermos o ápice da nossa vida social;  de buscar conhecer, descobrir e de se descobrir como um animal relacional.


Ao se comportar assim, o jovem faz novos amigos sem ao menos perceber. Coleciona afetos e desafetos que, expostos numa balança, refletem bem mais chegadas que saídas. E pouco a pouco esse número de amigos cresce a ponto de parecer difícil um dia selecionar, por exemplo, convidados para uma comemoração reservada de aniversário sem que cause um mal-estar.


Em tempos de redes sociais, é que essa rede de contatos se amplia. Cresce de uma maneira tão assustadora, que nem mesmo a matemática, com sua progressão geométrica, consegue explicar. Ora! O jovem vive intensa e ininterruptamente dois mundos, fazendo com que não consiga mais distinguir o que seja uma amizade de apenas um seguidor. 


Mas logo chega uma fase mais madura (ou assim se espera de todos nós). Nela, passamos a ser mais seletivos. Ao longo dos anos, diante de tantas decepções e desilusões, aprendemos a separar o joio do trigo. Descobrimos que nem todos que fazem parte da nossa vida, do nosso show, das nossas redes sociais, fazem por merecer o título de amigo 


Aprendemos que não vai ser qualquer um que vai sorrir conosco quando contarmos uma piada sem graça; que não vai ser qualquer pessoa que vai dividir conosco as dor de uma tristeza, tampouco a alegria de uma.conquista; e que não vai ser qualquer um que vai ser convidado ou se oferecer a segurar na alça do nosso caixão e chorar as lágrimas de um último adeus.


E será bem nessa fase mesmo que nos tornamos mais pacientes, compreensivos e tolerantes. Nela aprenderemos a perdoar e passaremos a ter a certeza de que muito mais vale a qualidade, contada nos dedos das mãos, talvez de uma só delas, a ter a quantidade traduzida em decepções protagonizadas por pessoas que em nada importarão para nós, que sem demora nem sequer lembraremos de seus nomes.