quinta-feira, 6 de outubro de 2016

O Clube dos Tímidos

L.F. Riesemberg

Eles não falavam em público. Não entravam em discussões. Não se destacavam nos esportes e não tinham namoradas. Mas conquistavam as melhores notas do colégio e não havia qualquer tipo de reclamação contra eles. Eram os tímidos, que mantinham-se isolados dos outros e também não conversavam entre si.
Theodore estava caminhando em direção à sala de aula, como o faz todos os dias, quando um garoto com quem nunca havia falado lhe esbarrou e entregou um envelope. “Pegue isso”, sussurrou e desapareceu no meio dos outros. Dentro do banheiro, Theodore abriu a carta e ali havia um convite. Dizia: “Juntos, somos mais fortes. Venha hoje às ... horas no endereço... Ass: Peter”. Ele imaginou que aquilo poderia ser mais uma brincadeira dos valentões da escola procurando humilhá-lo, mas o menino que entregou o convite tinha as características de quem sofre bullying, e não de quem o pratica.
Na hora marcada, Theodore chegava ao local indicado. “Este é o nosso clube secreto”, disse Peter. Lá ainda estavam outros três garotos que também haviam sido chamados.
Assim teve início o clube dos tímidos, formado pelos jovens repudiados, chamados de nerds, que sempre andavam sozinhos. “Não podemos viver assim, suportando tudo o que nos fazem”, disse Peter. “Se ficarmos unidos, poderemos lutar contra todos!”.
Theodore gostou da ideia do clube. Não tanto pelo lema da “luta”, conforme o proposto, mas pelo fato de finalmente fazer amigos. Naquela tarde, conversaram como nunca, e decidiram que o objetivo seria vingar-se de todos aqueles que já os haviam humilhado no colégio. Fizeram uma lista com dez nomes, e aqueles seriam os alvos de suas vinganças. “Lembrem-se: ninguém pode saber sobre nós”, avisou Peter.
No segundo encontro, surgiram as primeiras ideias para combater os valentões. Theodore concordou em pegar primeiro o Roger, que era um gordo que sempre roubava o lanche dos garotos menores. O plano era levar um sanduíche temperado com condimentos especiais, fabricados no laboratório instalado no clube, e fazer com que ele o comesse.
Os cinco tímidos trabalharam muito até obter a fórmula perfeita, e no dia seguinte, à hora do intervalo, criaram a situação para que seu inimigo roubasse o lanche. Tudo funcionou como o esperado e, antes do fim daquela manhã, Roger teve que ser levado da escola em uma ambulância, com minhocas saindo pelas narinas. O clube secreto comemorou discretamente a conquista e, à tarde, se reuniram novamente para planejar contra o próximo da lista.
O segundo atentado também funcionou, assim como o terceiro e os seguintes. Em menos de um mês, todos os velhos inimigos estavam machucados, doentes ou suspensos – pegos colando nas provas ou portando substâncias proibidas - graças aos planos mirabolantes dos tímidos.
“Um viva aos dias de paz que estamos tendo!”, comemoraram os cinco, que não sofriam mais nas mãos dos valentões.
Mas a paz durou pouco. Logo as vítimas das vinganças voltavam a ocupar o colégio, ainda mais perigosas. “O que vamos fazer agora? Hoje já me roubaram e me bateram”, disse um dos participantes do clube. Era preciso um plano mais eficaz, mas para isso o líder Peter cobrou mais riscos. “Como assim?”, disse Theodore, discordando. “Se formos longe demais, não será mais um clube de tímidos. Nós é que seremos os maus!”. O grupo se dividiu, e Theodore anunciou que estava se retirando do clube. Voltou a andar sozinho pelos cantos da escola. Assim ficava vulnerável aos perigos, mas ao menos tinha a consciência limpa.
Na semana seguinte, durante um dia que era para ser normal no colégio, todos os alunos e professores tiveram uma experiência traumatizante. Na hora do intervalo, ouviu-se um estrondo no banheiro masculino, e então saiu de lá um grande e terrível monstro. Ele rugia raivosamente e já havia abatido três jovens que usavam o sanitário. Quando Theodore soube que dois deles estavam na lista das vinganças dos tímidos, teve a certeza de que Peter estava por trás daquilo.
-O que foi que você fez? – perguntou aos gritos, enquanto muitos jovens corriam assustados e as paredes desabavam.
Peter chorava. Dizia que o plano estava fora de controle.
- Não era para machucar inocentes! Desculpe-me, Theodore, por não ter te ouvido...
Estilhaços voaram sobre suas cabeças, e Peter entregou um frasco com uma poção azul.
-Somente isso pode detê-lo. Tem que jogar nos olhos dele!
Ao redor só havia caos e destruição. Ouviam-se golpes e rugidos ferozes vindos da cantina. Theodore, com o elixir em mãos, pensou: “esta é a minha hora”, e caminhou em direção ao perigo, pronto para salvar quantas vidas pudesse e, mais do que isso, disposto a provar o seu verdadeiro valor - não aos outros, mas à única pessoa a quem realmente deveria fazê-lo.

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