O drama do amor
No poema Este inferno de amar, o eu lírico nos mostra uma confusão espiritual em relação aos sentimentos da paixão. Usando de figuras de linguagem, como antíteses e paradoxos, o terceto de seis versos livres declamam o amor e a dor. (Texto I)
Logo no início do primeiro verso, o eu lírico nos transparece uma ideia totalmente contrária do que se tem do amor, para ele, o sentimento retrata tristeza, dor e angústia por tê-lo no coração. Há de se notar, ainda na primeira estrofe, uma confusão de pensamentos, pois ora o amor encoraja, ora anula o ser, desejando, no último verso, o apagamento total desse sentimento, dentro de si.
Na segunda estrofe, o "eu" lírico não deseja simplesmente retornar ao passado para obter outra vida, o desejo é quando o amor era somente um sonho, fato típico dos românticos, mas não o sofrimento real que hoje vivencia. Nos versos finais faz a alusão ao passado, quando seus dias eram mais serenos, antes de se concretizar a paixão e começar a sentir o inferno de amar; em contrapartida, o sujeito poético afirma que somente começou a viver quando conheceu seu objeto de desejo, ao fitar seu olhar nos sensuais "olhos ardentes" do outro, causando-lhe a dor e o prazer. É suplico e também aprazível esse sentimento que corrói sua vida e, conjuntamente, lhe dar amor. Revelando em tom irônico a impossibilidade de amar, em junção de características bem romanescas, o poema Não te amo é composto de anáforas, com rimas consoantes e toantes no seu sexteto de quatro versos livres, nos quais, o primeiro verso de cada estrofe é mais longo e os outros três são menores, compondo-se de seis sílabas. (Texto II)
A negação da paixão
Iniciando com musicalidade a sua confissão de amor às avessas, o eu lírico declama seu sentimento pela mulher imaculada, pois ela parece ser intocável por ele. De caráter bem subjetivo, há nos versos o drama da morte de sua alma, pois o mesmo possui dentro de si "A calma do jazigo".
Na segunda estrofe, se por um lado o eu poético demonstra um amor carnal ao afirmar "quero-te", por outro lado o seu amor transparece de forma idealizada; há a negação de sentimento, uma inércia espiritual. A paixão sensual que é manifestada na terceira estrofe causa no poeta uma espécie de arrependimento, que é eminente nos versos seguintes, quando o eu lírico declama uma existência deplorável de si mesmo.
Na estrofe final temos a mulher como a típica "mulher demônio" dos períodos romanescos, o desconforto sofrido pela incapacidade de amar e, conjuntamente, desejar a mulher que deveria possuir somente em plano ideal, causando um conflito, isto é, um dualismo entre o amor e o querer.
A dor é o prazer
Formado por três tercetos de seis versos em redondilha maior, o poema é composto do paradoxo "gozo e dor", no qual observamos também a forte presença do pronome "tu", juntamente com antíteses e hipérboles. (Texto III) Na primeira estrofe, os três primeiros versos proferem uma pergunta ao "tu", na qual o próprio "eu", ao respondê-la, parece tentar justificar sua resposta nos versos seguintes que formam o poema.
Na estrofe segunda, o eu lírico demonstra melancolia pelo "tu", mesmo transparecendo ser amado por ele, sua alma não encontra estado de satisfação; o prazer, para o "eu", quando sentido de forma demasiada, acaba por ser transformado em dor. Na terceira estrofe há uma declaração penetrante da paixão, o eu lírico parece ser um refém total do "tu", punindo-se por sentir um amor sensual e mostrando uma instabilidade emotiva em relação ao próprio "eu", quando afirma "ou a vida - ou a razão", como se o sentimento assim posto não lhe saciasse a vida.
FIQUE POR DENTROUm breve retrato do artista e de sua estética
João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett nasceu na cidade do Porto, em 1799, vindo a falecer em 1854. Além de escritor foi também jornalista, político e advogado. Introdutor do período romancista, é considerado o iniciador da prosa moderna em Portugal. À época do seu primeiro exílio em Paris, publicou no ano de 1825 sua obra de grande renome no período romancista português: o poema lírico-narrativo "Camões". Admirador do teatro, o autor dedicou parte de seus estudos a dramaturgia, principalmente ao clássico grego. Na poesia, foi um dos primeiros a se libertar dos estilos clássicos do século XVIII, e a introduzir em seu país de origem uma nova estética romântica. Propala em 1853 seu último livro, Folhas Caídas.
Trechos
TEXTO I
Este inferno de amar - como eu amo! /mo pôs aqui n´alma… quem foi? / Esta chama que alenta e consome, / Que é vida - e que a vida destrói. / Como é que se veio atear,
/Quando - ai se há-de ela apagar? /// Eu não sei, não me lembra: o passado, /A outra vida que dantes vivi / Era um sonho talvez… foi um sonho. / Em que a paz tão serena a dormi! /Oh! Que doce era aquele olhar… / Quem me veio, ai de mim! Despertar? /// Só me lembra que um dia formoso / Eu passei… dava o Sol tanta luz! / E os meus olhos que vagos giravam, / Em seus olhos ardentes os pus. / Que fez ela?
Eu que fiz? Não o sei; / Mas nessa hora a viver comecei...
TEXTO II
Não te amo, quero-te: o amor vem d´alma. / E eu n´alma - tenho a calma, / A calma do jazigo. /Ai!, não te amo, não. /// Não te amo, quero-te: o amor é vida. / E a vida - nem sentida / A trago eu já comigo. /Ai!, não te amo, não. /// Ai!, não te amo, não; e só te quero / De um querer bruto e fero / Que o sangue me devora, / Não chega ao coração. /// Não te amo. És bela, e eu não te amo, ó bela. / Quem ama a aziaga estrela / Que lhe luz na má hora / Da sua perdição? /// E quero-te, e não te amo, que é forçado. / De mau, feitiço azado / Este indigno furor. / Mas oh! Não te amo, não. /// E infame sou, porque te quero; e tanto / Que de mim tenho espanto, / De ti medo e terror... / Mas amar!... não te amo, não.
TEXTO III
Se estou contente, querida, / Com esta imensa ternura / De que me enche o teu amor? / - Não. Ai não; falta-me a vida; / Sucumbe-me a alma à ventura: / O excesso de
gozo é dor. /// Dói-me a alma, sim;
e a tristeza / Vaga, inerte e sem motivo, / No coração me poisou. /Absorto em tua beleza,
/ Não sei se morro ou se vivo, / Porque a vida me parou. /// É que não há ser bastante / Para este gozar sem fim / Que me inunda o coração. / Tremo dele, e delirante / Sinto
que se exaure em mim / Ou a vida - ou a razão.
NATALI DE MORAES SILVACOLABORADORA*
*Do Curso de Letras da Uece
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