segunda-feira, 12 de junho de 2017

UM CHICLETE PARA ENGANAR A FOME

Autor: Carlos Delano Rebouças

Em plena década de 80, por dificuldades imensas passava Carlinhos e seus quatro irmãos, mãe e pai, desempregados, sofridos, estes, sem condições para sequer alimentar a sua família. Coitados... Eram somente mais uma família brasileira dentre tantas outras daquele Brasil de meu Deus, que não conseguiam ver uma luz no fim do túnel, escuro, sob a penumbra de um militarismo dominante, que comandava a nação.
Um dia, Carlinhos se dirigiu a sua mãe e baixinho perguntou: “Tem alguma coisa para comer”?
Já passava do meio-dia e sequer tinha feito uma refeição no dia. Estava faminto aquele garoto de 12 anos, raquítico, magrelo, e pálido, que mais parecia um menino de 06 anos de idade.
Quando seu pai ouviu o clamor do filho pródigo, sem ter muito a oferecer, deu-lhe una goma que ganhara como parte do troco de um cigarro comprado, dizendo: “Mastigue, mas não engula. Depois tome um copo d´água e vá deitar-se, que a fome passa”.
Assim o pobre menino fez, obedecendo às ordens do pai e sem dizer nada aos irmãos, que se encontravam na mesma condição. A princípio, mostrou-se feliz por está mascando um chiclete por inteiro, quando no máximo, ganhava um minúsculo pedaço de seus amigos, de condições mais favoráveis. Aqueles filhos de pais mais abastados da vizinhança.
Eram os mesmos garotos que lhe cediam suas roupas perdidas, muitas vezes rasgadas, mas muito bem recebidas, como se fossem novas, saídas da loja.
Carlinhos não largou aquele chiclete. Mascava-o incessantemente, até que o mesmo já estava esbranquiçado, perdendo totalmente a sua cor e o doce originais, mas que nada impedia a volúpia daquele carente menino.
O sono chegou e seu maxilar já estava cansado de tanta mastigação. Seu estômago, também cansado, de esperar a queda de alguma coisa, de onde só vinha saliva e nada mais. Sua fome estava enganada temporariamente, e o menino, exaurido, caído na sua rede furada, num sono profundo, ainda teve tempo para sonhar com dias melhores, e neste sonho, tudo estava superado, sem fome a passar com sua família. Assim contou posteriormente a todos.
Pena que Carlinhos não demoraria a acordar e a realidade mostraria a sua face real e verdadeira. Pena, também, que seu pai não teve mais chicletes para oferecer aos outros irmãos, esposa e a si mesmo. Todos ficaram invejosos com o sono profundo de Carlinhos.

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