quinta-feira, 23 de abril de 2015

MEU CAIXÃO NÃO TEM COFRE


Por Carlos Delano Rebouças

Um certo empresário não descansou em paz até a sua morte, aos 103 anos, diante da preocupação sobre todo o seu patrimônio, seus negócios, dinheiro e o destino que deveriam ter. Coitado, morreu sem ao menos saber como foi seu funeral.

Muitos levam a vida inteira dessa forma, presos à matéria, como se fizessem parte de seus corpos, como se fossem uma perna, um braço, a cabeça, e até a orelha.

Falando em orelha, que as desse empresário não era a das menores, mal couberam em seu caixão, luxuoso, em madeira de lei trabalhada, e com alças e fechaduras douradas, chamou a atenção. Dizem que as orelhas são partes do corpo humano que crescem até o fim da vida, e no caso desse empresário, foram 103 anos de crescimento como a fortuna que imaginava levar consigo em seu caixão.

Pobre empresário, que de rico, só a fortuna acumulada, e sem ninguém para deixar, que o amasse de verdade, ou pelo menos, o respeitasse como ser humano digno de uma lágrima a se derramar, na veracidade de um sentimento.

Família não constituiu; Viveu grande parte de sua vida, logo que perdeu cedo seus pais em um acidente, para cuidar da herança deixada, tornando-se uma pessoa que via o dinheiro como a coisa mais importante de sua vida.  Somente funcionários, poucos, aliás, contatos nos dedos de uma só mão, estiveram presentes, levados pela sensatez e gratidão de acompanhar aquele que pelo menos pagou seus salários durantes muitos anos. Somente por isso, e nada mais.

Porém, muitos se perguntavam. Para quem ou onde foi a sua fortuna? Quem passou dominar todo o império construído por um homem, sozinho e egoísta, e que jamais acreditou que seu fim poderia chegar?

Perguntas ainda sem respostas, mas todos tinham uma certeza: a de que naquele caixão não havia espaço para levar tudo que enxergou como mais importante na sua vida; que o fez passar por cima de tudo e de todos, de forma impiedosa, desumana e injusta.

Assim deixou esse mundo. Foi-se um homem que acreditava, sem ao menos declinar, que poderia levar em sua urna toda a sua riqueza, material, num cofre, que cabem, única e exclusivamente, riquezas espirituais.

Nenhum comentário:

Postar um comentário